Escutas da PF revelam esquema de policiais corruptos no Alemão.
Policiais militares e civis, acusados de desviar armas, drogas e dinheiro na ocupação no fim de novembro do conjunto de favelas do Alemão, na Zona Norte do Rio, não dispensavam nada de valor deixado pelos traficantes nas comunidades. O esquema é revelado pelas escutas telefônicas feitas pela Polícia Federal na Operação Guilhotina, deflagrada na sexta-feira (11), na maior ação contra o esquema de corrupção nas polícias do Rio.
Gravações de conversas entre um policial e um informante foram exibidas pelo Fantástico neste domingo (13). A reportagem teve acesso a trechos dos diálogos, gravados durante a ocupação no Alemão. Uma das escutas mostra um policial negociando armas e drogas que eventualmente fossem abandonadas por bandidos em fuga.
Policial: O que ‘tu’ ver aí, 30 por cento é teu.
Informante: Falou, valeu.
Policial: Já fechei aqui.
Informante: Falou.
Policial: Aí ‘tu’ lá de cima a gente vai se falando com calma. Sem se expor.
Outro trecho revela a má conduta de um policial na casa de um traficante que tem o apelido de Choque.
Policial: Os ‘morador’ tão fazendo o seguinte: na casa do Choque o pessoal foi catando e eu falei: ‘Pode apanhar tudo aí’. Todo mundo levou pra casa os bagulhos, aí. Duas ‘piscina’, móvel de primeiro mundo. Aí eu falei: ‘Apanha tudo aí’. Nego apanhou tudo. Apanhou ar-condicionado. Dei tudo pra pro pessoal levar. Tapete, o pessoal gostou... tudo levando pras ‘casa’ deles.
Informante: E pra mim, você não pegou nada pra mim, não?
Em outro momento, um policial fica decepcionado por encontrar somente material para embalar drogas.
Polícia: Só achei endolação. Não achei nada de droga. Mas de endolação joguei tudo no chão. Vou levar isso pra quê? Aquele negócio de balança. Aí tinha um cafofo. Fui lá, falei: ‘Vou achar aqui’. Caixa d’água, dentro de casa, vazia. Entrei lá dentro e não tinha nenhuma.
Em mais um trecho, o policial mostra a intenção de roubar pares de tênis. Para a polícia, o que eles chamam de tênis pode ser fuzis.
Policial: Tem uma laje aqui cara que tem sete pares de tênis zero.
Informante: Pode descer com a viatura, entra com a viatura no estacionamento.
Policial: ‘Tá’ maneiro, ‘tá’ maneiro então. Vou entrar no estacionamento. A Polícia Federal começou a investigação sobre o envolvimento de policiais corruptos com o tráfico e milícias a partir de em setembro de 2009. Na época, a PF se preparava para invadir a Favela da Rocinha, em São Conrado, na Zona Sul do Rio, mas a missão foi cancelada.
Os agentes descobriram que a operação havia vazado para os traficantes. Os criminosos comandados por Antônio Bonfim Lopes, o Nem, teriam sido alertados por policiais civis e militares.
Com o avanço das investigações a PF descobriu uma extensa rede de colaboradores dos bandidos dentro de batalhões da Polícia Militar e delegacias. Cada grupo de informantes chegava a receber R$ 50 mil quando avisava os traficantes de operações policiais na favela. Também ganhavam para dar proteção a milicianos e à máfia dos caça-níqueis.
A investigação revelou ainda a participação de personagens importantes da segurança pública, como o ex-subchefe de Polícia Civil, delegado Carlos Antonio de Oliveira. O policial, que está preso, é suspeito de apropriação e desvio de armas e drogas apreendidas com criminosos.
Desde janeiro, Oliveira estava cedido à Prefeitura do Rio, como subsecretário de Ordem Pública. Na nova função, segundo a Polícia Federal, continuou fazendo negócios com criminosos.
Outro personagem conhecido é o inspetor Leonardo da Silva Torres. Ele começou a chamar a atenção pelo hábito de fumar charuto nas operações e usar uniforme camuflado. Leonardo, mais conhecido como Trovão, chegou a aparecer num documentário exibido pela BBC de Londres, em 2009. A equipe inglesa registrou o inspetor em ação, numa favela carioca.
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